O impacto da afetividade na aprendizagem na adolescência

Blog O impacto da afetividade na aprendizagem na adolescência

10/10/2023
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Conforme indica o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é considerado criança quem tem até 12 anos; já os adolescentes são aqueles que estão na faixa etária entre os 12 e os 18 anos. A adolescência é considerada por muitos como um “período complicado”, e isso é natural. Trata-se, afinal, de uma fase de amadurecimento, de descobertas e de muitas mudanças, inclusive hormonais. É o momento de transição no desenvolvimento físico e psicológico da pessoa, em que ela deixa de ser criança e entra gradativamente na vida adulta. E quando pensamos no processo educativo desse período, qual é o impacto da afetividade na aprendizagem? Acompanhe este post e descubra!

Teoria de Henri Wallon: recursos de aprendizagem do ponto de vista afetivo para a puberdade e a adolescência 

Henri Wallon foi um educador francês que colocou luz sobre a importância da afetividade no processo de ensino-aprendizagem. Em sua teoria psicogenética, há o apontamento de que a criança e o adolescente devem ser considerados de maneira integral, completa, sendo compreendidos em diferentes aspectos — biológico, afetivo, social e intelectual. 

Wallon define 5 estágios do desenvolvimento, são eles: 

  • 1º estágio: impulsivo-emocional (0-1 ano);
  • 2º estágio: sensório-motor e projetivo (1-3 anos);
  • 3º estágio: personalismo (3-6 anos);
  • 4º estágio: categorial (6-11 anos);
  • 5º estágio: puberdade e adolescência (11 anos em diante).

No artigo Afetividade e processo ensino-aprendizagem: contribuições de Henri Wallon, de autoria de Abigail Alvarenga Mahoney (PUC-SP) e Laurinda Ramalho de Almeida (Faculdade Oswaldo Cruz), as autoras discorrem sobre como a afetividade se manifesta enquanto recurso de aprendizagem em cada uma dessas fases. No caso da puberdade e adolescência, dizem que: 

“No 5º estágio vai aparecer a exploração de si mesmo, na busca de uma identidade autônoma, mediante atividades de confronto, autoafirmação, questionamentos, e para isso se submete e se apoia nos pares, contrapondo-se aos valores tal qual interpretados pelos adultos com quem convive. O domínio de categorias cognitivas de maior nível de abstração, nas quais a dimensão temporal toma relevo, possibilita a discriminação mais clara dos limites de sua autonomia e de sua dependência.

O recurso principal de aprendizagem do ponto de vista afetivo volta a ser a oposição, que vai aprofundando e possibilitando a identificação das diferenças entre ideias, sentimentos, valores próprios e do outro, adulto, na busca para responder: quem sou eu? Quais são meus valores? Quem serei no futuro?, que é permeada por muitas ambiguidades.

O processo ensino-aprendizagem facilitador do ponto de vista afetivo é aquele que permite a expressão e discussão dessas diferenças e que elas sejam levadas em consideração, desde que respeitados os limites que garantam relações solidárias.”

Fonte: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psie/n20/v20a02.pdf

A partir desse trecho, conseguimos entender como a Educação Empreendedora pode ser valiosa para a aprendizagem no período da adolescência. Veja: “atividades de confronto, autoafirmação, questionamentos” convergem com diferentes propostas de metodologias ativas, como seminários, debates e júris simulados. Para além disso, as premissas da Educação Empreendedora passam pela formação de um jovem autônomo, crítico e capaz de gerar valor para si e para o mundo, e daí a importância do desenvolvimento das habilidades socioemocionais, que são caras para qualquer faixa etária, mas podem ganhar ainda mais importância durante as várias descobertas da adolescência. 

A importância da afetividade na relação com os adolescentes 

O estudo Influência de um ambiente afetivo positivo, em sala de aula, sobre o estado motivacional de adolescentes do ensino médio, de autoras1 da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), investigou como a afetividade em sala de aula exerce influência na motivação em aprender por parte dos adolescentes.

A pesquisa foi realizada de março a dezembro de 2018, com 836 adolescentes do ensino médio, de sete escolas públicas e estaduais. Entre as conclusões, destacam-se: 

  • “Os alunos são perceptivos e são influenciados pelo estado de humor do professor e que ele afeta positiva ou negativamente na motivação dos alunos em aprender.”
  • “Um professor amigo, conselheiro, interessado, sério em alguns momentos e brincalhão em outros momentos, com voz serena e chamativa foram as características positivas levantadas pelos adolescentes do ensino médio para que se sintam motivados a aprender.” 
  • “Todas as condições que se fazem necessárias para transformar o espaço escolar num ambiente acolhedor, com princípios pedagógicos eficazes estão relacionadas com a afetividade e o trabalho docente.”

Fonte: https://downloads.editoracientifica.org/articles/210404102.pdf

Além disso, a pesquisa também destaca como é importante a demonstração de uma preocupação verdadeira da escola e do educador com os alunos adolescentes. Nesse período, dar significado à experiência e promover trocas no ambiente social são movimentos que têm ainda mais valor. “A escola pode ser um local propício para a criação de um ambiente mais estimulante e afetivo ao adolescente, tendo o professor como aliado, como aquele que impõe limites e possibilidades aos alunos, permitindo que o adolescente o perceba como alguém que, além de lhe transmitir conhecimentos e preocupar-se com a apropriação deles, compromete-se com a ação que realiza, percebendo o aluno como um ser importante, dotado de ideias, sentimentos, emoções e expressões”, revelam as autoras. 

E essa proposta também conversa com o que diz Paulo Freire em Pedagogia da Autonomia, ao compartilhar um relato sobre sua experiência na adolescência. 

“Às vezes, mal se imagina o que pode passar a representar na vida de um aluno um simples gesto do professor. O que pode um gesto aparentemente insignificante valer como força formadora ou como contribuição à do educando por si mesmo. Nunca me esqueço, na história já longa de minha memória, de um desses gestos de professor que tive na adolescência remota. Gesto cuja significação mais profunda talvez tenha passado despercebida por ele, o professor, e que teve importante influência sobre mim. Estava sendo, ermo, um adolescente inseguro, vendo-me como um corpo anguloso e feio, percebendo-me menos capaz do que os outros, fortemente incerto de minhas possibilidades. Era muito mais mal-humorado que apaziguado com a vida. Facilmente me eriçava.

O professor trouxera de casa os nossos trabalhos escolares e, chamando-nos um a um, devolvia-os com o seu ajuizamento. Em certo momento me chama e, olhando ou reolhando o meu texto, sem dizer palavra, balança a cabeça numa demonstração de respeito e de consideração. O gesto do professor valeu mais do que a própria nota dez que atribuiu à minha redação. O gesto do professor me trazia uma confiança ainda obviamente desconfiada de que era possível trabalhar e produzir. De que era possível confiar em mim mas que seria tão errado confiar além dos limites quanto errado estava sendo não confiar. A melhor prova da importância daquele gesto é que dele falo agora como se tivesse sido testemunhado hoje. E faz, na verdade, muito tempo que ele ocorreu…”

Trecho retirado do livro Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa

Percebe a força e a capacidade de afetar um estudante que tem um professor, especialmente em um período de tantas mudanças? Educar também é sobre afeto, e o educador é imprescindível nesse processo de geração de afeto e significação das experiências. 

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1Rosane Antunes da Silva, Sílvia Leticia dos Anjos Ventura, Iara Kerch Soares e Adriana Barni Truccolo.
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