Construindo a autonomia: reflexões sobre anomia e heteronomia na Educação Empreendedora

Blog Construindo a autonomia: reflexões sobre anomia e heteronomia na Educação Empreendedora

23/11/2023
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Muito se fala sobre autonomia (e a sua importância), mas do que estamos falando quando citamos uma pessoa autônoma, afinal? Para Immanuel Kant, um dos filósofos mais influentes da modernidade, um ser dotado de autonomia é aquele que é capaz de agir por vontade própria, mas com uma independência que se direciona a partir de princípios morais. 

Como sabemos, um dos objetivos da Educação Empreendedora é auxiliar na construção da autonomia dos estudantes e, para compreendermos esse processo de construção, é preciso olharmos para duas etapas anteriores à autonomia: a anomia e a heteronomia. Você sabe a diferença entre esses três conceitos e como todos esses fatores se manifestam na Educação Empreendedora? Continue a leitura e descubra! 

Anomia e heteronomia: etapas da construção da autonomia

Kant defende que a autonomia é não só um direito, mas também uma construção. Exatamente por isso, é algo conquistado gradualmente, por fases, determinando uma escala de desenvolvimento, de progressão. E é aqui que entra a anomia e a heteronomia, que são etapas que precedem a conquista da autonomia

A partir das definições de Kant, Jean Piaget, psicólogo suíço e estudioso da psicologia evolutiva e da psicologia da educação, fez uma série de estudos para entender o desenvolvimento da autonomia nas crianças e nos adolescentes. 

Para ele, a passagem da anomia para a heteronomia na criança se dá quando ela aprende a estabelecer interações com adultos e com outras crianças. Já o desenvolvimento da autonomia acontece na adolescência, quando há a construção dos próprios valores, entendimento das regras sociais e formação da sua identidade. 

Entenda melhor: 

Fase 1 – anomia (crianças até 5 anos)

Esta é a fase em que a criança não tem nenhum conhecimento ou consciência sobre as regras da sociedade. Por desconhecê-las, não há também a capacidade de seguir ou respeitar essas regras. “Geralmente a moral não se coloca, com as normas de conduta sendo determinadas pelas necessidades básicas. Porém, quando as regras são obedecidas, são seguidas pelo hábito e não por uma consciência do que é certo ou errado. Um bebê que chora até que seja alimentado é um exemplo dessa fase”, detalha o artigo do UOL que explica o desenvolvimento moral por Piaget.

Fase 2 – heteronomia (crianças de 6 a 9 anos)

A partir do momento em que a criança começa a ter consciência das regras sociais, ela chega neste estágio, o da heteronomia. Nesta fase, há um conhecimento básico acerca das normas, mas elas são seguidas a partir da autoridade do outro (professor, mãe ou pai, por exemplo). É quando há um respeito unilateral, uma imposição que chega de outra pessoa, não de uma consciência própria. 

Fase 3 – autonomia (crianças de 10/11 anos em diante)

Aqui, então, chegamos à autonomia. É quando existe a capacidade, por si só, de entender o que é correto moralmente — a partir de valores e princípios que foram absorvidos ao longo da vida. Neste estágio, o respeito passa a ser uma troca, algo mútuo e recíproco. Mais do que somente cumprir as regras, o sujeito compreende o que está por trás daquilo e o porquê de estar agindo de determinada forma. 

A Educação Empreendedora nesse contexto

A Educação Empreendedora dialoga de forma direta com o desenvolvimento da autonomia nos estudantes, uma vez que ela pressupõe um cidadão crítico, que consiga refletir acerca do seu entorno e tomar decisões que possam impactar de forma positiva tanto a própria vida quanto a daqueles que estão ao seu redor.

No artigo “Da heteronomia à autonomia: ambiente escolar e desenvolvimento moral”, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), a autora Jaqueline Barbieri Pieretti traz reflexões sobre o desenvolvimento da moralidade no ambiente escolar. Para isso, ela realizou entrevistas individuais com crianças de diferentes idades e contextos escolares. Entre as conclusões, está a de que o professor, a escola e as vivências escolares têm grande influência no desenvolvimento da sua autonomia. Veja: 

“Observei que a idade e a etapa do desenvolvimento moral em que [as crianças] estão influenciam diretamente na forma como consideram as regras e as punições. Entretanto, observei que as vivências escolares dos alunos também influenciam no desenvolvimento do pensamento autônomo. Como muitos autores que estudam o tema apontam, o professor e a escola podem contribuir nesse processo. Se o construtivismo concebe a aprendizagem a partir da interação entre o sujeito e o meio, então este meio, que pode ser o professor e o ambiente escolar, são determinantes no processo de aprendizagem do aluno.

Dependendo de como a escola concebe a aprendizagem e de como o professor planeja a rotina escolar, a interação entre os alunos é incentivada ou não. Existem tipos de atividades específicas e formas de organização da sala de aula que contribuem para que as crianças interajam, deparando-se com situações de cooperação, respeito mútuo e até mesmo situações de conflitos em que precisam se colocar no lugar do outro. Para Piaget, quando as crianças vivenciam apenas situações de trabalho individual, o egocentrismo espontâneo é reforçado. 

Outra forma de contribuir para o desenvolvimento moral é incentivar os alunos a participar das decisões e elaborações das regras coletivas da turma, bem como das resoluções de situações em que algum grupo, turma ou aluno demonstram insatisfação sobre algum acontecimento ou regra da escola. E é claro que para que os alunos se manifestem em relação às suas insatisfações, é essencial que o professor, a escola e os colegas garantam um espaço em que as manifestações sejam ouvidas e respeitadas. As assembleias escolares são atividades que propiciam que todos tenham uma atuação efetiva na elaboração das regras, são momentos em que a palavra do aluno é garantida e o grupo pode discutir sobre situações de respeito ou desrespeito, busca de soluções, ajuda e felicitações e, sobretudo, incentiva que os alunos ouçam opiniões diferentes das suas e aprendam a respeitá-las”

Fonte: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/25211

A conclusão desse estudo evidencia como a Educação Empreendedora pode ser valiosa no desenvolvimento da autonomia das crianças e dos jovens. Exatamente porque as metodologias utilizadas e as premissas da EE passam pelos lugares citados: incentivar o trabalho em grupo, a cooperação, a participação na tomada de decisão. Além disso, esse olhar também propicia o desenvolvimento das habilidades socioemocionais, que ocupam grande parte desse cenário. 

O processo de aprendizagem na Educação Empreendedora busca desenvolver o protagonismo juvenil por meio de diferentes iniciativas, como as citadas pelo artigo acima: assembleias e eventos similares que trabalham, em especial, o senso de pertencimento e a capacidade de tomada de decisão do estudante. 

Ao colocar em seu planejamento momentos de trabalhos que estimulem a partilha de conhecimento, a resolução de problemas ou conflitos e a tomada de decisão dos estudantes, você promove uma Educação Empreendedora e contribui para o desenvolvimento e aperfeiçoamento da autonomia dos nossos jovens.

E por aí, você já conhecia tudo sobre anomia, heteronomia e autonomia? Esperamos que esse conteúdo apoie a sua jornada! Continue acompanhando o Portal do CER e não perca nenhum conteúdo do mundo da educação.

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