As possibilidades do ensino híbrido e da tecnologia no desenvolvimento dos estudantes com Pedro Carlos

Blog As possibilidades do ensino híbrido e da tecnologia no desenvolvimento dos estudantes com Pedro Carlos

27/01/2023
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Os debates sobre o uso da tecnologia na educação e sobre as possibilidades do ensino híbrido não são novos, mas ganharam ainda mais força com as consequências da pandemia.

Conversamos sobre o assunto com o professor de tecnologias educacionais Pedro Carlos, que tem mais de 20 anos de experiência como docente. Confira a conversa e veja o que ele tem a dizer sobre o ensino híbrido e a presença da tecnologia no universo da educação.

Com o cenário da pandemia, os recursos tecnológicos utilizados na educação vieram para ficar, mais do que nunca. Como você enxerga a recepção da comunidade escolar a essas novidades?

Creio que ainda há dois grupos na educação, ou entre os docentes, que eu caracterizo como “tecnófobos” e “tecnófilos”. De um lado, temos os tecnólogos, aqueles que têm medo da tecnologia; de outro lado, os tecnófilos, aqueles “amigos da tecnologia”.

Com a pandemia, de certa forma, os professores foram quase obrigados a adotar as novas tecnologias nas aulas. Então eu acho que, ainda hoje, existe um grupo de professores que tem certa dificuldade de lidar com as tecnologias na sala de aula. Muitas vezes por falta de conhecimento, ou mesmo por falta de habilidade técnica, porque, nos cursos de formação de professores, nós não aprendemos isso.  Os cursos, aliás, estão muito longe da realidade que encontramos na sala de aula.

Mas eu creio que isso veio para ficar, como vocês afirmaram na pergunta. Acredito que, de agora para a frente, todos nós professores teremos que nos tornar tecnófilos e perder o medo do uso da tecnologia em sala.

Quais são as principais transformações que o ensino híbrido traz para a educação brasileira?

Olha, eu penso que as transformações ocorreram de várias formas. Eu sou uma daquelas pessoas que acreditam muito na educação a distância, no ensino híbrido e nas possibilidades que isso pode trazer para nós, principalmente em um país em que ainda há uma defasagem enorme de acesso à escola.

Em um país de dimensões continentais como o nosso, certamente o ensino híbrido pode trazer muitas oportunidades, sobretudo para aqueles estudantes que precisam entrar no mercado de trabalho muito cedo, que não têm tempo para dedicar o tempo todo aos estudos – seja na Educação Básica, seja no Ensino Médio, seja no Ensino Superior.

Na graduação eu julgo que o ensino híbrido pode ser visto como uma oportunidade para quem precisa “estar” lá e não tem tempo, quer por trabalho, quer por viagem, quer mesmo por uma questão de deslocamento.

As transformações que o ensino híbrido pode trazer para a educação brasileira passam pela questão da oportunidade, embora ainda haja certa resistência de muitos professores e até de alguns estudantes. Mas penso que é uma realidade e, ao mesmo tempo, uma possibilidade que pode representar uma oportunidade a fim de que possamos inserir mais gente na educação.

Hoje, grande parte das empresas já estão utilizando o ensino híbrido nos seus treinamentos e na capacitação. Eu acredito muito nas possibilidades e vejo não como um problema, mas como uma oportunidade para as atuais e as futuras gerações.

Acredita que o ensino híbrido deve ser utilizado apenas em casos “emergenciais”, como o da pandemia, ou ele pode ser útil também em contextos “normais”? Por quê?

De forma alguma. Eu acho que ele não deve ser utilizado somente em casos emergenciais como foi a pandemia, muito pelo contrário. É uma realidade que está acontecendo e que vai ser cada vez mais presente nos nossos dias. O ensino híbrido é uma possibilidade enorme para permitir que mais pessoas tenham acesso à educação.

Hoje, grande parte das pessoas tem o smartphone na palma da mão, com acesso à internet. Isso vai dar  a elas a liberdade de acessar o conteúdo, de ver uma palestra, de assistir a uma aula de onde quer que estejam. Suponho que principalmente por causa da acessibilidade é que são conceitos muito caros à nossa época. Acredito muito na educação híbrida como uma oportunidade para todas as pessoas.

Os recursos tecnológicos na educação podem favorecer o desenvolvimento das competências socioemocionais dos estudantes? Como?

É muito importante essa pergunta porque é um dos desafios que aparecem frequentemente nas discussões dos professores e dos pais e responsáveis.

Como trabalhar essas competências socioemocionais, por exemplo, em um curso híbrido? Ou em um curso a distância? Eu creio que, no ensino híbrido, temos outra forma de estar presentes. A presença virtual é só outro modo de lidar com o outro e é também um aprendizado para os estudantes e os professores, isto é,  saber como lidar com esse outro que não está ali do seu lado fisicamente, mas que está do outro lado da tela.

Virtualmente ou não, ele continua sendo um sujeito, continua tendo seus desafios, as suas dificuldades. Eu vejo que os recursos tecnológicos podem e devem ter esse objetivo, de nos aproximarmos uns dos outros, porque somos obrigados a aprender essa nova forma de convívio.

Vivemos em um mundo hiperconectado. Isso traz muitos benefícios para o processo de ensino-aprendizagem, mas também precisa haver cautela. Nesse sentido, quais cuidados você recomenda para gestores e professores?

O professor Augusto Cury, certa vez, citou que  vivemos a época da síndrome do pensamento acelerado. Isso é viver em um mundo em que estamos cheios de informações, dados, conteúdos. O pensamento acelerado aumenta a ansiedade, e isso acaba gerando em nós um excesso, um acúmulo de informações; e assim ficamos lutando na sala de aula com a dificuldade de contração dos alunos.

Essa síndrome do pensamento acelerado é uma realidade presente nas escolas. Trata-se de uma questão com a qual vamos ter de aprender a lidar; precisamos ter muita cautela em relação a isso para sabermos de que forma utilizar as tecnologias em sala de aula sem que haja excesso. Eu acho que em tudo nós temos de buscar a medida certa, o equilíbrio. É esse o desafio.

Como acredita que o ensino híbrido pode contribuir para a personalização do ensino, respeitando a forma de aprender de cada indivíduo?

Essa é uma ótima pergunta porque cada um tem seu ritmo de aprendizagem. Muitas vezes um estudante que tem dificuldade em se concentrar em sala de aula tem facilidade de aprender assistindo a um pequeno vídeo na tela do seu celular.

Então acredito que essa é outra vantagem do ensino híbrido, ou seja,  é a possibilidade de o próprio aluno construir e organizar a sua trilha de aprendizagem, no seu tempo.

Existem pessoas que têm mais facilidade de estudar e de se concentrar à noite, de madrugada ou no período da tarde. O ensino híbrido possibilita isto: a personalização do ensino ou o respeito às características individuais de cada estudante.

A autonomia do estudante é uma habilidade cada vez mais estimulada pelas instituições escolares. Como o ensino híbrido e a tecnologia em sala de aula podem contribuir para esse desenvolvimento?

A questão da autonomia é fundamental para que o ensino híbrido tenha sucesso. Eu acredito que a própria dinâmica do ensino híbrido, das metodologias ativas com o suporte da tecnologia, por exemplo, acaba levando o estudante a trabalhar nisso. Porque, em algum momento, ele vai ter de sentar sozinho para buscar outras leituras, para pesquisar, para selecionar material; isso o ajuda no desenvolvimento de sua autonomia.

Pensando na importância dos laços sociais e afetivos, como trabalhar para que a tecnologia não seja um obstáculo nessas trocas, e sim uma aliada?

O filósofo Pierre Lévy, pensador que eu venho estudando há algum tempo, é um pesquisador das tecnologias. No seu livro “O que é o virtual”, ele trabalha uma questão importante: vivemos hoje em uma época em que fica difícil separar na nossa vida o que é privado e o que é público. Isso leva as pessoas a terem cada vez mais a necessidade de se expor, de tornar público aquilo que é privado. É por isso que as pessoas gostam de compartilhar a sua rotina, o seu cotidiano, as alegrias e as angústias também. Em algum momento, isso pode ser problemático, porque, à medida que eu coloco em público as minhas fragilidades e as minhas angústias, as pessoas podem não compreender bem, e isso pode se tornar um problema.

Eu sou extremamente otimista em relação às tecnologias e, assim como Pierre Lévy, que valoriza a ideia de comunidade. Quando falamos de comunidade, é aquele espaço em que as pessoas colocam as coisas em comum, compartilhando ideias e conhecimento, mas também seus sentimentos. Nesse sentido, as tecnologias podem ser, sim, uma grande aliada. Mesmo estando sozinho na sala ou no quarto da minha casa, se eu estiver conectado, eu não estou só.

Quais conselhos daria para professores e gestores escolares que ainda estão se adaptando a esse cenário do ensino híbrido e das tecnologias?

Eu não diria “conselhos”, mas talvez faria algumas “provocações”. Primeiramente é não ter medo das tecnologias e não achar que elas vieram para substituir os humanos. Depois, dizer que nós precisamos quebrar esse paradigma dos chamados “nativos digitais”, porque todos nós podemos e devemos aprender a lidar com a nova realidade. Temos de enxergar o ensino híbrido como mais uma possibilidade para agregar valor ao trabalho das instituições de ensino e dos professores.

Uma das premissas da Educação Empreendedora é formar pessoas prontas para gerar valor para o mundo. Como o ensino híbrido e as tecnologias podem favorecer isso?

A Educação Empreendedora é a educação que responde às necessidades dos dias atuais. Eu, como professor de Filosofia também, gosto muito de pensar no sentido das palavras. Vamos analisar um pouquinho a palavra “protagonista” (de “estudante protagonista”): ela vem do grego “protos”, que quer dizer “primeiro”; “agonista” faz referência ao lutador, competidor; nas guerras gregas, o protagonista era aquele que ia na frente da batalha.

Nós temos que educar os nossos estudantes para que sejam cidadãos protagonistas – e e cidadãos do mundo. Por isso a Educação Empreendedora é fundamental: a fim de que nós possamos formar cidadãos que pensem globalmente, mas que ajam localmente. Ou seja, interferindo na sua comunidade e sendo agentes transformadores para a construção de uma sociedade melhor.

Acredito que o ensino híbrido e as novas tecnologias favorecem isso à medida que possibilitam aos nossos nossos estudantes a estarem o tempo todo em contato com pessoas do mundo inteiro, com acesso a várias informações. A ideia da “inteligência coletiva”, como diz Pierre Lévy, é fundamental para que possamos levar em conta que não estamos sozinhos no mundo; e as ações e atitudes de cada um, de alguma forma impactam a vida de outras pessoas.

Por isso repito que a Educação Empreendedora é fundamental para que sejamos capazes de formar cidadãos profissionais diferenciados, atento às necessidades do novo milênio em que estamos vivendo. E o ensino híbrido, por sua vez, é uma oportunidade para que mais pessoas acessem a educação.

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