“Aprender é abraçar o incerto”. Essa foi uma das várias reflexões que o designer de experiência de aprendizagem, questionador de futuros, palestrante e professor Eduardo Valladares fez em sua participação na última edição do ConheCER.
Com a palestra “Vulnerabilidade é potência”, Eduardo trouxe para a superfície temas que parte da sociedade prefere – não necessariamente com consciência disso – manter ocultos. E por que, afinal, tanta resistência aos sentimentos? Como é que se abrir para as emoções pode – ao contrário do que aprendemos – favorecer não só o processo de ensino-aprendizagem, mas tudo o que está em seu entorno? Em uma entrevista à equipe do Portal CER, o professor respondeu a essas e a outras questões. Confira!
A coragem, nesse caso, tem muito a ver com a ousadia de querer tentar ser uma pessoa mais evoluída. Claro que isso tem o tempo de cada um. E precisa estar ligado ao momento de vida, à intenção de futuros, à vontade de estar aberto ao novo, ao incerto, ao inesperado. Isso nos capacita, de certa maneira, a entender que podemos ser mais colaborativos, criativos, autoconfiantes, autônomos.
A vulnerabilidade está ligada ao processo do sentir. Aprender é sentir. Quando a gente se vulnerabiliza, a gente mostra a nossa humanidade. E isso tudo repercute na forma como tratamos, enxergamos e lidamos com as nossas emoções. As emoções são o melhor caminho para a autoconsciência, para o autoconhecimento, para a vulnerabilidade. Se estivermos mais abertos às emoções, ao processo do sentir, poderemos aprender de forma mais clara, genuína, espontânea, verdadeira, e não impositiva, burocrática e compulsória.
A educação não funciona sem a vulnerabilidade.
Diria que a gente não pode mais pensar em posturas diferentes. Acredito que vale o mesmo para qualquer posição em que estejamos. Vale frisar aqui a postura de aprendiz. Eu também aprendo quando ensino, quando me coloco numa postura ativa de escuta, de compaixão, de empatia. Isso abre uma verdadeira conexão. Aprender requer conexão. Então, professores e gestores, de uma forma em geral, precisam também fazer o grande exercício de querer estar aberto ao novo, ao inesperado, ao incerto e trabalhar com suas emoções. Isso nos torna mais potentes.
Com certeza, ainda corrobora. Infelizmente, estamos pautados na hora de aprender com a lente do “sucesso a qualquer custo”. Costumo dizer nas minhas falas e palestras: precisamos quebrar a ditadura do sucesso em nome de uma aprendizagem do sentir.
Acredito que aquele modelo de ensino e aprendizagem baseado em modelo apenas de sentar, escutar, anotar e se preparar para concurso, prova e pelo viés sempre do resultado da excelência em prol de colocações em exames e vestibulares se desgastou, ficou ultrapassado e sem sentido. Algo que acarreta malefícios para a saúde mental, traz prejuízos de conexão, de sentido e até de aprendizagem mesmo.
Enquanto tivermos o “sistema único de sucesso” cujo imperativo é a felicidade, a conquista, estritamente, pela aquisição da formatura e aquisição de diploma e certificado, a gente ainda vai lidar com uma educação compulsória, impositiva e sem chance para a arte, a ciência, a tecnologia, o empreendedorismo aparecerem.
Incentivando aprendizes a se conhecerem, estimulando a troca sadia, a colaboração em grupo, a mediação dos debates, o estímulo ao “pensar de novo”, a reflexão em cima da sensibilidade e não do automatismo. Mas insisto: isso não é tarefa única da escola ou de educadores. Essa prática deve começar pela mudança do sistema. Na verdade, temos a possibilidade de termos mais de um sistema. Sou contra essa monopolização do viés único de sair do Ensino Médio e fazer faculdade. Ninguém sabe ainda, com total convicção, o que deseja seguir, cursar, investir energia e empenho aos 18, 19 anos.
Precisamos revisitar o conceito de “carreira”. É, nessa hora, que cabe tanto falar e mostrar que aprendemos sempre, em tudo. E não apenas na ocasião de escolhas por formação. Esse ponto muda bastante nossa abordagem futura.
A tecnologia é transversal em tudo, né? Este é o primeiro passo, a meu ver: desmistificar a visão de que a tecnologia apenas atrapalha e impede de as pessoas serem mais próximas.
Enxergo a tecnologia como aliada nesse processo como já acontece em vários países e até no Brasil, com aplicativos, sites, ferramentas que nos ajudam a mapear emoções, medir cenários de conexão entre pessoas e grupos, criação de redes e plataformas de apoio colaborativo em amplos aspectos. Um bom exemplo é a tecnologia apoiando durante a questão pandêmica com profissionais ligados ao cenário da saúde mental.
Mais que isso, já há projetos em que podemos entender nosso fluxo emocional, nossa forma de agir e reagir a determinadas situações e isso servir de aprendizado constante.
Gerar maior proximidade entre aprendizes – de todas as esferas. Colocar estudantes mais perto do papel de serem ativos e não apenas espectadores de eventos obrigatórios e impostos.
Professores continuam com seus devidos papéis.
Sempre gosto de sugerir uma educação baseada na experiência da aprendizagem – o que, na prática, mostra que crianças, jovens, adolescentes podem ser mais participativos na hora de pensar em atitude prática de aprendizagem.
Acredito que o estímulo ao encorajamento, a vibração pela tentativa, o “acolher pelo exemplo”, em detrimento de uma liderança que apenas abraça o exemplo como pressão, sofrimento. Aquele papo de que não se pode escorregar, falhar, pois “o que os alunos vão pensar de mim se eu não souber a resposta? Sabe?
Então, lembra da resposta sobre quebrar a ditadura do sucesso? É isso! Parece que tudo que está ligado ao futuro precisa estar atrelado à pressa, à velocidade, “correr em busca do atraso”. Minha opinião – respeitando sempre contexto, cenário, prioridades – é que falta falarmos sobre a inteligência do sentir. A inteligência do coração. E, para sentir, precisamos de tempo, reflexão, apreciação das emoções.
O sistema nos coloca numa dicotomia que parece não ter erradicação. Para nos preparar para o futuro, parece que temos que sentir sempre o discurso da inadequação, do medo, da insegurança. Não concordo com isso!
Sugiro que comecem a ouvir mais o que aprendizes sabem, vivem, experimentam, sentem. Não tem essa de que “na minha época, eu era obrigado a aprender o que os professores mandavam!”. Essa lógica de que crescemos com tudo sendo preestabelecido já venceu desde o final do século passado. Construir junto – é nisso que acredito. Relação de convite, de humildade, de aprendizado mútuo.
Ler o livro “O erro de Descartes”, do Antônio Damásio
Ler o livro “A coragem de ser imperfeito”, da Brené Brown
Este podcast em que falo mais aprofundado sobre o conceito que desenvolvo de Aprendabilidade.
https://open.spotify.com/episode/4AmgZVVUAnfygaYTrYWTyv?si=OuwGElALR1GQ0JeZnfcn7A
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